Artista brasileira Habuba Farah morre aos 94 anos em São Paulo

Still do vídeo “Entrevista com Habuba Farah”, 2021. Créditos: Gomide & Co.

Morreu neste domingo (3), Habuba Farah, conhecida por seus trabalhos voltados ao abstracionismo geométrico. A morte aconteceu por causas naturais. A informação foi confirmada pelas galerias Gomide & Co e MaPa, que representavam a artista e publicada na Folha de S. Paulo.

Filha de imigrantes libaneses, Farah nasceu em Getulina, interior de São Paulo, em 1931. Iniciou sua trajetória ainda muito jovem, na década de 1950, quando teve aulas com o artista romeno Samson Flexor (1907-1971). Conhecido como um dos pioneiros da abstração no Brasil, Flexor teve influência seminal no percurso da artista em direção ao campo da abstração geométrica. Habuba também teve aulas com Mario Zanini e, a partir de 1958,  já havia dado início aos estudos cromáticos, que permearam o seu fazer artístico ao longo de toda carreira.

A artista faz parte da geração formada nos anos 1950 pelos eventos promovidos por uma série de instituições culturais criadas no imediato pós-guerra em São Paulo, com destaque para o Museu de Arte de São Paulo, inaugurado em 1947, o Museu de Arte Moderna de São Paulo, em 1949, a Bienal do Museu de Arte Moderna de São Paulo, em 1951, e a Biblioteca Municipal de São Paulo que, naquele momento, sob a direção do crítico Sérgio Milliet, funcionava como um centro cultural, reunindo jovens em torno de sua coleção de livros e revistas de arte. 

Retrato de Habuba Farah, 2023. Foto: Gomide&Co

Com quantas cores se faz um cinza?

Segundo a curadora Heloisa Espada, a artista investigou “incansavelmente as variações cromáticas do chamado ‘cinza neutro’, ou cinza colorido, obtido a partir da mistura de uma cor primária (amarelo, azul ou vermelho) com sua respectiva complementar (violeta, laranja e verde). Como um prisma que refrata a luz em comprimentos de onda de cores variadas, as pinturas de Farah revelam a infinidade de matizes potencialmente contidos nestes cinzas altamente vibrantes, ao acrescentar, pouco a pouco, pequenas quantidades da cor primária ou da secundária à mistura original”.

Interessada em explorar transformações cromáticas de extrema delicadeza, a artista também adicionava ínfimas porções de branco às cores “retiradas” dos cinzas neutros. As telas de Farah organizam uma miríade de tons em estruturas geométricas que muitas vezes se assemelham a feixes de luz”. 

Sua produção passou a ser reconhecida como “Abstracionismo-Geométrico- Lírico” – termo cunhado pelo crítico Mário Schenberg em 1971, ao descrever a produção de Farah em relação não só ao abstracionismo, mas à arte moderna como um todo. 

Habuba Farah. “Sem título”, 1952. Foto: Marcello Paotta. Acervo MASP

 

A artista trabalhou constantemente com pintura, desenho e colagem, tendo como foco as pesquisas cromáticas em torno do cinza neutro quase sempre aliadas à geometria. Durante décadas, ela expôs seus trabalhos no Brasil e no exterior, e manteve contato com críticos e intelectuais interessados em sua produção, como José Geraldo Vieira e Theon Spanudis. Mesmo assim, o reconhecimento de seu trabalho pelo sistema das artes nacional é tardio. Como muitas mulheres artistas, após o casamento e o nascimento dos dois filhos, nos anos 1960, Farah precisou dividir seu tempo entre a produção artística, a família e as aulas de arte que ministrou entre as décadas de 1960 e 1980, em sua casa, em São Paulo. Dado o volume de obras produzidas nestes anos, tudo indica que ela preferiu adensar suas investigações pictóricas a se dedicar à promoção de uma carreira artística profissional.

Como apontado pelas pesquisadoras Luciara Ribeiro e Khadyg Fares, “mesmo que Habuba Farah não tenha o gênero feminino e a origem familiar como temática de suas obras, estes são pontos, histórica e estruturalmente, diferenciadores na legitimação nas artes. Há aqueles que os vêem com certo exotismo e curiosidade, e outros que identificam neles a manutenção da colonialidade e desigualdade. Segundo o pesquisador e curador Paulo Herkenhoff, se observadas criticamente, as origens territoriais e  étnico-raciais são fatores de exclusão nas artes. Ele revela perceber na trajetória do geometrismo artístico do século 20 – linguagem e período relacionados com a obra de Habuba Farah – certa exclusão a partir de relações de origem de seus autores”. 

Habuba Farah. “Sem título”, 1998. Foto: Edouard Fraipont/Gomide&Co

 

A última exposição individual de Habuba Farah no Brasil foi realizada na galeria Gomide & Co de novembro de 2023 a fevereiro de 2024. Ocasião na qual foi lançada sua primeira publicação monográfica. Organizado por Lívia Debbanè, o livro é dividido em capítulos denominados ‘Guaches’, ‘Pinturas’, ‘Recortes’ e ‘Pastéis’, e apresenta textos de Sooud Al-Qassemi, Fernanda Lopes e Marcos Moraes. Já sua última exposição internacional foi encerrada muito recentemente, em maio, na Galeria Artbooth, localizada em Abu Dhabi – capital dos Emirados Árabes Unidos.

Durante uma trajetória artística de mais de 70 anos, Farah participou de diversos salões de arte no Brasil, França, Itália, Estados Unidos e Japão. Exibiu obras nas edições de 1963 e 1695 da Bienal de São Paulo e, em 2021, foi incorporada ao acervo do MASP. E suas obras também fazem parte da coleção do Museu de Arte Moderna de São Paulo.

Habuba Farah. “Sem título”, 2023. Foto: Edouard Fraipont/Gomide&Co

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